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Susan Souza, do Cinnamon Tapes, fala sobre estúdio, Sonic Youth e o poder do feminino

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Por Stefanie Gaspar

A simbologia do feminino envolve muitos temas: sagrado, profano, onírico, ventre, mãe e conexões infinitas com mitologias, crenças e nosso passado histórico. Um pouco desse poder e suas interpretações permeiam o álbum “Nabia”, disco de estreia da cantora , compositora e instrumentista Susan Souza.

Assinando como Cinnamon Tapes, Susan começou a pensar no álbum em meados de 2012, e iniciou o processo de gravação em 2016 ao lado de Steve Shelley, ex-Sonic Youth. Em 2017, a gravação continuou, desta vez em São Paulo, e o processo terminou com a masterização da engenheira de som April Golden.

Conversamos com Susan sobre o processo de gravação do álbum, sua relação com o feminino e outras temáticas dentro de “Nabia”.

Como foi ir até NY gravar com Steve Shelley em 2016? Como foi pra você esse processo de estúdio, de sentar com ele, gravar, decidir acordes, sonoridades?

Foi uma honra gravar no estúdio onde o Sonic Youth gravou seus últimos álbuns, por ter sido uma banda que admiro muito desde adolescente. Sobre o disco, toda a construção das melodias das guitarras base, vozes, letras, violão, alguns solos de guitarra e o piano de “Ventre” foram minhas e o Steve não mudou nada nas composições, só acrescentou. Meu trabalho com ele foi muito marcado pela parceria e diálogo, foi muito tranquilo e construtivo.

Como produtor, ele cuidou bastante para que a gravação ficasse boa tecnicamente, orientando em vários momentos, e depois participou ativamente da mixagem para encaixar as sutis camadas de instrumentos e deixar tudo de acordo com nossas ideias. Sempre buscando um resultado bem natural e fiel à captação. Antes da gravação acontecer de fato, trocamos muita referência e eu fui mandando demos e sugestões, ele também mandava ideias à distância até que a gente se encontrasse.

Eu me senti muito ouvida e respeitada durante todo o processo. Apesar de ter sido meu primeiro disco, trabalhamos em um clima de muita amizade e colaboração em que todas as pessoas em estúdio, incluindo engenheiro de som, músicos parceiros e a engenheira que fez a masterização, tiveram sua opinião considerada para que o disco ficasse legal aos ouvidos de todos dentro da minha proposta.

Qual seu relacionamento com o estúdio de gravação? Li que seu processo de composição é mais onírico, livre, abstrato, e queria saber como esse lado menos prático se une aos equipamentos e parte mais empírica do disco.

Eu me preocupei bastante com os ensaios prévios que fiz sozinha antes de chegar lá, porque eu queria estar bem segura das minhas partes para não perder tempo de gravação por eu ter um período contado de dias disponíveis. O estúdio foi importante para que eu e o Steve nos conhecêssemos musicalmente, porque nós não tínhamos tocado as músicas juntos antes de eu chegar em Hoboken. Nas duas vezes que fui até lá, em fevereiro de 2016 e abril de 2017, ensaiamos um pouco antes de começar a gravar, até para que ele pudesse compor as partes dele na bateria e percussão e para que a gente entendesse a estrutura das canções completas. Acho que o processo das minhas letras seria a parte mais abstrata do processo.

Quanto às melodias sou bem mais prática. Apesar disso, às vezes inspirações novas acontecem quando você chega para gravar, talvez uma nova entonação, talvez a troca de alguma palavra ou até notas novas que brotam no último minuto. Por exemplo, compus o solo da música “Sacred Waves” lá na hora mesmo. Enquanto terminavam de mixar uma outra faixa, peguei a guitarra e em minutos nasceu o solo, que já foi gravado em seguida para que eu não esquecesse a ideia!

Susan Souza, do Cinnamon Tapes

Vi que você se refere a “Nabia” como um disco que reverencia o mar, nascimento/morte e o universo feminino. Como você enxerga essa entidade do feminino? O que ela significa para você? Dentro do estúdio de gravação, como é possível transformar esse conceito em sonoridade?

Eu quis que o disco abrisse e fechasse com sons de mar e pássaros, que eu mesma montei em uma workstation da Korg, porque queria que esse disco tivesse essa marca de início e conclusão, que respeitasse essa ideia de nascimento e morte, de sair do ventre, de sair das águas do útero e encarar a terra. Um disco é um parto artístico, de certo modo, e “Nabia” foi meu nascimento como cantora e compositora.

As letras tratam de assuntos femininos em diversos momentos, às vezes de maneiras mais abstratas, como em “Lua”, que fala da sombra que habita a mulher que vive um relacionamento abusivo, ou mais óbvias como em “Ventre” e “Sacred Waves”, que falam sobre a mulher, o útero/concha, a divindade interior que habita nosso corpo, enfim, tudo isso e outros símbolos que emprestei da astrologia e do tarô codificados nas entrelinhas das canções — claro que do meu jeito, seguindo a minha visão na época da composição. A cada dia vou ter mais cascas para refletir sobre o ponto de vista feminino da vida. Aliás, tenho feito músicas novas sob esse ponto de vista e pretendo lançar ainda nesse semestre.

Você decidiu ter um relacionamento mais minimalista com o estúdio em “Nabia”, com poucos recursos de estúdio, guitarras simples e sem efeitos nas vozes. Por que essas escolhas?

Sempre gostei mais de artistas econômicos que expressam muito com pouco. Quanto mais cru o trabalho, mais posso ver a alma deles e isso me encanta demais. Claro que tenho meus momentos de ouvir artistas mais “rebuscados” para o meu gosto, mas, em geral, estou sempre escolhendo aqueles que optam pelo mínimo. Foi realmente natural compor de um jeito simples também. Para mim, a sonoridade mais simples soa mais coerente com minhas escolhas pessoais e até mesmo com a maneira como eu quero passar minhas mensagens de um jeito mais direto. Por ser econômico em efeitos, é um disco que funciona bem ao vivo quando estou sozinha com a guitarra, não contrasta tanto com o material do estúdio.

Quais álbuns de mulheres brasileiras te chamaram a atenção nos últimos meses? E no cenário internacional?

Sou fã absoluta do coletivo Rimas e Melodias e também achei muito interessante os trabalhos novos de Xênia França, My Magical Glowing Lens e Tiê. No cenário internacional, estou vidrada nos novos discos da Björk, Charlotte Gainsbourg e Kelela.

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